A ATUALIDADE DA SEMANA DE ARTE MODERNA DE 1922
A Arte moderna
que através de suas vanguardas do século XX, estabeleceu a ditadura da transgressão. Através de seus manifestos, futuristas, dadaísta, surrealistas
etc., ditavam uma nova forma de ver e do fazer artístico. Não aceitando mais entre os artistas qualquer regra
acadêmica.
Na virada do século XIX/XX os ares da modernidade
palpitavam nas mentes humanas, trazendo a tona essa exigência pelo novo, pela renovação dos costumes, como também da percepção humana. E as mentes de artistas e cientistas
inconformados com o que esta estabelecido é
que fazem a ponte para a realidade.
Se a arte e os
artistas fossem conservadores estaríamos ainda no estilo rupestre.
Se temos uma
Capela Sistina que passa a mensagem além do que a igreja queria na época e
ainda deixa mensagens subliminares precisou um artista inconformado com o clero
apesar de ser pago por ele
Se temos novas regras de proporção, perspectivas,
expressividade facial nas figuras e novas técnicas de pintura no renascimento é porque artistas como
Giotto, Van Eick, Leonardo e Michelangelo inconformados com a realidade ainda
com os resíduos bizantinos e o mundo gótico próximo ainda dos céus dourados,
mudaram totalmente o ideário imaginário da época com suas novas percepções e
experiencias.
Se temos uma
Guernica, uma LES DEMOISELLES D’AVIGNON de Picasso é porque este virou as
costas para tudo que já existia, não se perturbando de ser ridicularizado
Temos Kandinky
que virou as costas também as imagens reconhecidas pelo cérebro, trazendo o
novo ver e perceber do universo abstrato.
São tantos
exemplos que pudemos buscar na história da arte que mostram o quanto os
artistas com seus recados artísticos foram transgressores.
Uma pergunta
não quer calar:
Quando uma forma de
expressão artística se degenera e encerra um ciclo?
Resposta: Quando a transgressão quer se tornar
um status quo, quando se torna um establishment, quando passa a ser
permanentemente o novo normal, quando quer permanecer ditando, não inovando, quando
deixa de ser questionadora do passado recente. Pois ai deixa de trazer o novo
olhar e passa ser uma norma, um cânone.
O próprio
movimento da Arte moderna nos mostrou isso. Quando os artistas passaram a discriminar tudo que não fosse moderno, quando
passaram a perseguir e humilhar o que não estava dentro de seus cânones. Isso
mesmo, cânones, quando passa a ser uma receita, um ismo. Ai perde o sentido do
novo, da transgressão. Quando se torna norma a transgressão aí caímos no
previsível, no pensamento linear, e para transgredir o previsível? Eis a
questão!
Depois de 1945
os ares de cansaço das vanguardas começaram a ser sentido, ou seja, as normas
ditadas pelos artistas modernos foram caindo no lugar comum. Surgindo então daí
os movimentos Pós-Modernos.
Como seria difícil transgredir os transgressores! Que foram os artistas modernos até
então. Portanto, já estávamos férteis com um novo universo de imagens colocadas
aos olhos da humanidade por essa nova leva de artistas que permearam as
Vanguardas. Para tanto os ares do pós modernismos se apoiaram na transgressão
do vale tudo, nada a discriminar. Foi isso que os pos modernos fizeram.
Qualquer manifestação artística(?) seria válida, mesmo que ela estivesse eivada
pela arte clássica, desde que tivesse os traços do mundo contemporâneo.
Mas ai o vale
tudo descambou, perdendo-se de vista até mesmo a noção do artista transgressor.
Começando a permanecer o perfil do instantâneo, do “imediatico” (criando aqui
um neologismo) do nada....do vazio. Tivemos até uma
Bienal que assim se intitulou: Bienal do Vazio (28ª)
É isto, a arte
contemporânea caiu no vazio, e faz tempo, e o pior
que os assim se intitulam passaram a ser discriminadores do passado, tudo o que o pós modernismo não quis. Olham com ar
de superioridade qualquer manifestação que não seja do modismo que perpassam
pelas galeria e centros culturais “contemporâneos”. Pior
ainda serem fabricados da noite para o dia, artistas que são valorizados pelas
lavagens de dinheiro. Caindo por terra todo ideário da Arte, tornando
uma modinha, vazia, que se consome de um ano para o outro; sendo esquecida como
manifestação da mente humana. Logo desaparece, evapora, e nem é lembrado, salve
raras exceções, nesta sociedade altamente mediática e materialista. Nada contra
os bens materiais criados pelo espirito humano, mas apenas o vazio do esplendor
doa amor da matéria pela matéria.
Não vou
desprezar aqui manifestações pós modernas que foram muito geniais, mas devo
dizer que a porta foi aberta no período das
vanguardas mais especificamente no período dadaísta, quando a arte levou
ao extremo a ideia de transgressão, que chegaram ao extremo de proporem ate o
fim da arte e da cultura, pois revoltados e feridos pela violência do período
de guerra que a pouco tempo assolara a civilização europeia, a comunidade
artística questionavam então o valor que essa cultura humana tinha, pois apesar
de tanta evolução cultural, artística, bla, bla, bla, não tirou do ser humano o
ódio, a violência, não tornou-o mais solidário, menos primitivo nos
sentimentos.
O
questionamento levado as últimas consequências, levam a tal inconformidade propondo
então decretar o fim dessa cultura, que não serviu nem para tornar o ser humano
mais humano, reunidos pelo nome de dadaístas propuseram então decretar o fim da arte, o fim dessa cultura que não
serviu pra nada, daí os deboches e manifestações artísticas, (antiartísticas)
que tiveram como desfechos novas formas de expressão como as instalações, foto
montagem, colagens, intervenções e performances, criando obras de fundo
conceitual, as quais o mais importante é a ideia por detrás da imagem. Mudando
totalmente a concepção da contemplação do belo artístico. A arte já vinha se
refundando desde a passagem do século e chega ao seu ápice no dadaísmo.
A questão toda
que vemos em termos de criticidade histórica na dita Arte Contemporânea é a
despersonalização da arte, em sua maioria das vezes nem assinadas é , alguns
podem dizer sobre isso que a assinatura é vaidade. Valendo tudo não precisa nem
ser autoral, podendo ser gerida por uma agremiação, um grupo, pode ser um
projeto que se manda construir, ou anônima mesma, pode ser um evento que começa
e vai até se deteriorar e jogar no lixo. Portanto precisa de altos
financiamentos. O suporte de sustentação é infinito, a arte geográfica, pode
ser até no deserto ou na cratera de um vulcão. Vale tudo mesmo. Só não vale dizer
que isso não é mais como arte, que extrapolou toda ideia que temos de arte, que
são manifestações as quais poderíamos encontrar uma outra definição dentro da
cultura humana, porque além de não transgredir mais nada, por ficar na maioria
das vezes, no campo mediático, ou seja, de chamar a atenção e partir, podendo
até permanecer, mas tendo sua construção custado muitos milhões de dólares,
como na obra de Damien Hirst , refletindo a potência e poderio material. Muitas
vezes sendo financiada pela lavagem de dinheiro
Posto tudo
isso acima vamos agora entrar na Semana de Arte Moderna de 1922.
No primeiro dia da Semana de 1922 foi
declamado o poema “Pronominais” que de cara já propõe um rompante com os
Parnasianos que eram os guardiões da métrica impecável, da maneira culta de se
expressar. Propõe já uma transgressão à moda caipira.
Pronominais
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro.
Oswald de Andrade
Aliás grande
parte do manifesto dadaísta foi discorrer sobre as palavras:
“Não quero nenhuma palavra que
tenha sido descoberta por outrem. Todas as palavras foram descobertas pelos
outros. Quero a minha própria asneira, e vogais e consoantes também que lhe
correspondam. Se uma vibração mede sete centímetros, quero palavras que meçam
precisamente sete centímetros. As palavras do senhor Silva só medem dois
centímetros e meio.
Vemos, portanto, que esse
manifesto de 1916 chegou bem antes da Semana pelo grupo que se reuniu no Café
Voltaire em Zurique, ou seja 6 anos antes.
Assim como o Homem Amarelo do expressionismo
de Anita Malfatti foi movimento que teve seus primeiros precursores na passagem
do século, ou seja, 22 anos antes.
Assim como o cubismo de Ismael
Nery e Di Cavalcante deu-se início em 1905
Mas nada disso diminui nossos
artistas pois esses estilos depois de iniciados tiveram grande número de
artistas que continuaram a produzir obras por décadas.
A proposta de Oswald parece ter vingado,
portanto, de comer toda a arte estrangeira para pegar sua força como os índios
antropófagos faziam com os guerreiros capturados.
Na resenha de André Luís Borro
sobre o livro Tietê, Tejo, Sena: A obra de Paulo Prado, de Carlos Eduardo
Berriel “Com a Semana, a obra”, que cita: “há uma afirmação um tanto quanto
radical de Paulo Prado em relação à arte brasileira: “sempre nos aparece em
atraso de cinquenta a trinta anos todas as questões referentes à arte e à
literatura. Quando as novas fórmulas, já gastas e esgotadas, desaparecem, ou se
refugiam nos museus ou bibliotecas da velha Europa, surgem elas envelhecidas e
fora da moda nos nossos centros intelectuais” (do artigo “Brecheret”) do livro
“Tietê, Tejo, Sena”: A obra de Paulo Prado, de Carlos Eduardo Berriel
Portanto, na verdade esses artistas participantes
da Semana eram de origem de ricas famílias, da burguesia paulista. Na verdade,
já havia um saturamento da arte acadêmica da poesia parnasiana, corria se uma
onda que era mais interessante e ficava mais visível usar os rompantes
vanguardistas que sopravam do continente europeu. ... A própria burguesia já
não aguentava mais seu artificialismo intelectual.
Toda essa contraditoriedade
ideológica entre a política e a arte, mostra uma face oportunista do
brasileiro. Somos levados para onde sopram os ventos que dão status mas sem
consistências valorativas e formativas. Foi isso que aconteceu, portanto caiu
na mão de cabeças que tinham bastante profundidade e sensibilidade como Mario
de Andrade, Oswald e demais integrantes da semana, tornando bem mais fácil
buscar modelos prontos de transgressões pela arte nas Vanguardas Europeias.
É muito diferente o porquê da
criação de uma obra expressionista em sua origem dentro dos primórdios da
escola expressionista que surgiram de uma crise social e humana na passagem do
século, e de Anita Malfati que pintava à maneira expressionista. Era membro de
família burguesa, com formação em colégios internos e cursos no exterior
Muito diferente do nosso
Candinho, de nossa vizinha cidade de Brodowski que estudou ate o terceiro ano
escolar, e tudo tentou para conseguir o prêmio que o levaria a Europa para
estudar Arte. Neste ponto nos faz pensar num clamor que os cariocas sempre
fazem de que eles foram mais modernos que os paulistas, mas nesse episódio do prêmio
que Portinari recebeu prêmio do Salão Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro
nos mostra algo ao contrario, não estamos aqui falando da relevância de cada um
desses estados em termos de arte.
Na primeira tentativa de Candinho
em 1924, Portinari envia 9 retratos acadêmicos mais o “Baile na roça” de estilo
muito mais espontâneo, mais expressionista, com pinceladas a la primma. Para
sua surpresa foi aceito os nove retratos acadêmicos e o Baile na Roça foi
devolvido. Portinari ficou com isso entalado na garganta por um bom tempo. Em
1928 enviou o retrato de Olegario Mariano, seguindo os moldes academicistas,
então conseguiu o prêmio de viagem ao exterior. Sendo mantido pelo poeta Olegário
Mariano, Portinari escreve-lhe uma carta onde lamenta-se disso.
“Continuo cheio de saudades de
todos de nossa casa. Isso aqui é muito bom, muito gostoso, mas quem nasceu aí,
não pode viver muito tempo fora
O Brasil é mais bom, muito
mais. Depois, a gente se lembra de tudo e de todas as coisas desarranjadas do
Brasil, da terra da gente – das igrejas sem estilo, daquela gente boa que não
sabe ler… Aqui é tudo arrumadinho, as igrejas dos lugarejos mais bestas são de
estilo puro. O pessoal daqui sabe os direitos que tem. Oh! coisa sem sal…
Estou com uma saudade danada
de todos de nossa casa”.
E em outra carta diz:
Vou pintar aquela gente com aquela roupa e com aquela cor…
Portinari filho de família de imigrantes tinha a simplicidade de pessoa do interior. Seu traço expressionista com influencia do cubismo que estudou pelos museus de Paris quando de sua viagem prêmio. Faz um estilo moderno visceral baseado em sua personalidade e em suas origens simples.
Enfim o que continuamos a ver na arte neste nosso pais são manifestações hipócritas onde instituições culturais que colocam a arte contemporânea acimas de qualquer manifestação do passado, principalmente as modernista, portanto o nascedouro dessas novas vertentes contemporânea surgiram na arte moderna mais especificamente no período dadaísta, entretanto com variações que permeiam as outras escola das vanguardas.
Sentimos nesse emaranhado de proposições com facilidade o que quer ser apenas mediático, mas ainda se fazem nos nossos dias obras marcantes de conteúdo que atingem nosso amago, que permanecem dentro de nos modificando-nos o conceito de mundo como por exemplo a “Noite estrelada” de Van Gogh, Guernica de Picasso, “O grito” de Munch e quantas mais poderíamos citar, mas podemos buscar obras no período clássico também como uma Vênus de Milos, ou um Apolo de Belvedere, um David na Renascença. Enfim tantas obras que ficam entranhadas em nosso inconsciente coletivo tornando-se geradoras de concepções e imaginações estéticas dentro de nossa história de vida.
O que não podemos fazer é incorrer no erro que muitos dos contemporâneos passam a cometer querendo criar uma ditadura de obras conceituais mediáticas, a vida como lapso de tempo já vivenciamos cotidianamente em nossas atividades de trabalho e laser, precisamos do contemplativo, do menos conceitual, da paisagem imaginaria que entra e fica e nos deixa respirar.
Na carta de abertura de Graça Aranha tem todas a propostas que vingaram tanto nos artistas modernos como contemporâneos, na verdade vivemos ainda o moderno sob novas facetas
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