terça-feira, 29 de dezembro de 2020

ARTE ABSTRATA

 

A ARTE ABSTRATA

Não quero aqui tecer consideraçõos históricas da estética abstrata, e sim apenas registrar observações vivenciadas ao longo de meu trabalho artístico em relação a essa estética Artistica.

Fiquei inspirado em escrever este texto após colocar uma obra em redes sociais, um painel que estava por acabar  e pedi ali na minha postagem pra que decidissem o lado que deveria ficar a obra. Colocando duas fotos para optarem.

Posição 1


Posição 2

O que é o ABSTRATO?

Vamos ver o que diz os dicionários:

O que não é concreto; Que existe só na imaginação; Que inexiste; etc. 

As imagens dessa obra não tem formas referenciais da realidade, nem nenhuma figuração explicita, encontra se quadrados, círculos, triângulos, polígonos irregulares etc, além de outas formas orgânicas que são indefinidas.

Na execução do painel segui minha percepção de harmonia e contraste através de sentimentos de imagens que sugerem ao espirito meu estado do momento. Ora serenas, ora nostálgicas, ora agitadas. Sendo, na verdade, sempre uma fuga da realidade ficar imprimindo numa tela seu momento interior, conversando consigo mesmo, dando satisfações de meu viver para mim  mesmo escrevendo abstratamente na tela

Tem a hora também da contemplação do todo, ou seja:

O que esta fora do contexto?

O que esta gritando?

O que precisa gritar?

O que não esta claro (adjetivo)?

O que esta claro demais (substantivo)?

Qual é o sentido? Sentindo em mim o todo (da obra)

Condiz com meu sentido (sentimento) momento?

Levando então a algumas alterações em alguma parte para mudar o sentido, sentimento. Fazendo isso várias vezes durante a elaboração da obra

Um exercício de meditação abstrata com elementos puros dos sentidos ...sentimento.

Elaborando fora elaboro por dentro

Quando fiz a pergunta sobre o lado que gostariam que ficasse fiquei surpreso com os sentidos e sentimentos que cada um expressou, pois o abstrato, (sem sentido), é percebido com vários sentimentos. Vamos dar uma olhada em algumas expressões:

 Roselei Sueli Moraes Pereira

Miguel me chamou mais atenção a 1, por conta dos traços vermelhos no canto direito superior. Quem sou eu pra opinar, mas é sempre bom o olhar de quem não entende nada de obras de arte, assim como eu, mas se encanta e tem sua atenção despertada por um detalhe que muitos não observam

 Ana Silva

Acho a 1 mais harmônica, com mais equilíbrio

 Narege Atelier de Artes

O caos fica no meio , nas duas posições ! Resta saber se vc. quer a Paz no começo ou no final ... !

 Antonio Franco

Eu não gosto de dar palpites mas já que vc pediu aproveito pra dizer que o vermelho pediu muito pra um lado. Em todo caso fico com a posição 2

 José Eurípedes Reis

2 direita base para esquerda leve fly passando pela hidroelétrica de furnas!

 Fernanda Ripamonte

Gosto do 02, abaixo, aquela luz que está acima na esquerda fica, (no meu entendimento), melhor como sol.

Lindo, lindo

 Maria Beatriz Sacramento

Dos dois jeitos. O seu desenho tem um equilíbrio maravilhoso. Acho que devo chamar de abstrato. Não sei se posso chamar assim.

 Hermano Silva

Miguel meu amigo

Quando coloquei na horizontal e vislumbrei vi vestígios da uma Civilização Antiga que a partir da foto foto coloriu.

Que coisa estranha.

Parabéns esta magnífico!

 

Notem, pelos comentários, os sentido e sentimento produzidos!

Não tive professores de arte, fui autodidata a vida toda no exercício pictórico, mas tive amizades e conversas fantásticas com grandes mestres da arte de nossa cidade como, Pedro Manuel, Amêndola, Canova, Vaccarini e Leopoldo Lima. Nessas conversas extrai deles tudo que me tornou fazedor de Arte.

Lembro me do Amêndola falando, "Vira de cabeça pra baixo", "Olha esse pedaço isolado do resto"...etc. Com o tempo fui percebendo que uma obra abstrata é forte e atraente aos olhos quando ao colocá-la dos quatro lados os olhos gostam em todas posições.

Fora isso fui um estudante voraz de estética e História da Arte, apesar de tudo isto concluímos que, a arte esta fora quando esta dentro, que sentir faz sentido e sentido faz sentimento. São coisas básicas que está na vida de todos, pois mora na alma que vive dentro de cada um. Basta se permitir. Não precisa estudar nada, alias os estudos só referendam isto.

As observações dos amigos que se manifestaram demostram isso conforme listados acima.

É um trabalho abstrato, isto é, não quer contar nada, não quer mostrar nenhum objeto real ou ser da natureza, ou lugar, ou paisagem

Mas revela sentidos diferentes, conta histórias do interior de cada um, cria pontes de percepção com a existência (sentido). Não quer contar nenhum acontecimento, mas faz acontecer aos olhos que encaminham ao coração e à mente, ai criando sentido, sentimento,,, existência.

O lado que a maioria apontou foi a posição 1. Vou fortalecer alguns elementos plásticos apontados pela maioria do lado direito acima e finito. 

Grato a todos

MIGUELAI/IGELO

sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

OBRAS SURREAIS - POR MIGUEL AI/IGELO


 

AS MULHERES - OBRAS DE VÁRIOS PERÍODOS POR MIGUEL AI/IGELO


 

MOVIMENTO / AÇÃO - OBRAS DE VÁRIOS PERÍODOS POR MIGUEL AI/IGELO


 

FLORAIS - OBRAS DE VÁRIOS PERÍODOS POR MIGUEL AI/IGELO


 

CASAIS - OBRAS DE VÁRIOS PERÍODOS POR MIGUEL AI/IGELO


 

ARVORES E FLOESTAS - OBRAS DE VÁRIOS PERÍODOS - POR MIGUEL AI/IGELO


 

OBRAS ABSTRATAS DE VÁRIOS PERÍODOS - POR MIGUEL AI/IGELO


 

TIO

 

Esse período de pandemia me vem muitas vezes na cabeça a figura de um finado tio, irmão da minha mãe, que morou por muitos anos na casa dela. Tio Lívio.
Sempre me lembro dele pela maneira de ser e viver diferente de tudo que vi desde criança. Nunca encontrei nada semelhante até hoje. 
Tinha uma característica que me atraia muito, gostar de livros. Acho que peguei essa doença dele. Bibliomaníaco. Realmente é uma mania, uma tara, se pudesse traria todos livros pra dentro de casa. Mas tenho que sempre me conter. 
Quando morreu deixou 5 estantes de livros, contendo em torno de 5.000 mil livros.
Mas o que tenho a dizer sobre ele é sobre seu modus vivendis, muito estranho! Mas acho que estaria correta suas atitudes nessa pandemia.  
Vou descrever alguns traços para fazer-me entender melhor:
Mantinha as mãos e os braços sempre distante do corpo, era estranho o jeito dele andar com os braços tensos afastados. Como se tivesse nojo de se tocar. E tinha!
Não só de si, de todos. Nunca vi dar a mão praa ninguém ao cumprimentar. Se negava ao estenderem a mão para ele. Teve até uma passagem que ficou famosa contada por um jornalista, não me lembro o nome dele, do jornal “O Diário”, onde trabalhava como revisor, nos dias posteriores ao seu falecimento. Contou esse jornalista que certa vez o Governador Laudo Natel visitou a redação do jornal e estendendo a mão em cumprimento a cada um dos presentes na redação, ao chegar diante ao Sr Lívio com a mão estendida este lhe negou. Fato que deixou a todos perplexos. 
Lembro-me que uma vez o visitei na redação, não me lembro por qual motivo e fiquei perplexo de ver como trabalhava. Se apoiava com os cotovelos em uma mesa alta e os artigos entravam e saiam dessa mesa após sua leitura. Não se sentava porque haveria contato e em consequência, em sua cabeça, contágio, com alguns vírus que alojou em sua psique. Onde se apoiava tinha grandes pelotas de calosidade criadas pelo apoio do braço diariamente, uma em cada braço.
E tem mais
Recordo-me também que ao chegar de madrugada na casa de minha mãe ia direto para o banheiro, onde passava por 45 minutos lavando o braço da ponta dos dedos até ao ombro, passando água e sabão por várias vezes, como se tentasse tirar qualquer coisa ruim que ali tivesse pousado. Vi muitas vezes essa situação. Esse era o banho dele. 
Ao se deitar extraordinariamente diferente do costume das pessoas, não recolhia as pernas sobre a cama. Elas ficavam pra fora, estiradas para um lado. Até hoje me pergunto como aguentava dormir assim. 
Toda essa estranheza relatada aqui o fiz não pra relatar essa situação em si, mas as ideias que talvez suspeito estarem por trás desse comportamento, baseado em alguns livros que encontramos em sua vasta biblioteca, por exemplo coleção completa de Plinio Salgado, tudo sobre Hitler e muitas outras leituras com esse naipe ideológico. Seu comportamento era de misantropia. Quando minhas sobrinhas chegavam na casa da vó, era o maior terror pra ele. Xingava sem parar, excomungava, mandava embora. Não gostava de criança de maneira nenhuma. As netas se divertiam com isso. 
Esses dias atrás em conversa com um grande amigo sobre as situações políticas que estamos vivendo, ficamos procurando razões por ter pessoas que gostam do lado mau, de ver o próximo servilmente, que adoram o poder, a superioridade, o materialismo a qualquer preço. E muitos desses batem a mão no peito como verdadeiros cristão, não só evangélicos, muitos que ajoelham nas igrejas católicas também. Ficamos analisando as origens italianas que estão enraizadas em nossa genética. Na nossa querida Itália são muito forte esses traços dos lados extremos, conservador e progressistas. Extremismos de qualquer lado nunca deu certo. 
Por tabela os meus avós, pais de minha mãe, que vieram na imigração italiana pós guerra tinham esses traços contraditórios. Minha vó do lado conservador, católica de carteirinha, não saia da igreja, nervosa até! E meu avô, pedreiro de valor, fazia fachadas de casas com balaustradas decorativas, anjo em cima de janelas, trabalhador, progressista, contra a igreja, meio ateu, mas segundo minha mãe muto amoroso. 
O que tem a ver o tio Lívio, a pandemia, a família italiana então?
Tem tudo a ver comigo
O lado conservador de minha avó sobrepôs ao outro lado. Minha mãe se diferia das irmãs pois era mais humilde, caridosa e muito criticada por ter casada com um “pobretão”. 
A história de amor da minha mãe com meu pai é muito linda, ficou registrada num diário de amor escrito a dois, o qual fiz cópia, encadernei e guardo com muito carinho. Está lá nos registros o problema dessa visão discriminatória: meu pai trabalhava na “Forca Publica”, Policia Militar de hoje. Um esgar pra família conservadora antiga. “Só casa com a Olga se der baixa da farda”. Não tendo outra opção assim o fez. E isso foi muito ruim pois meu pai teve que encarar qualquer trabalho que surgisse pra poder sustentar sua família e isso inclui ir para o sertão desbravar fazenda de latifundiários.
Os locais de nascimentos dos filhos são diferentes, Miguelópolis, Santa Rita, Ituverava, Ribeirão Preto. Daí dá pra ver a vida itinerante que tiveram.  
Os irmãos, homens, sempre gostaram muito de discutir política nas festas da família, mas nenhum era dono da verdade, um ouvia o outro, convencia ou era convencido. Eram discussões calorosas, as vezes em altos brados, a moda italiana. Mas jamais brigas, ficar de mau, nada disso. Gostava muito disso, esperava ansioso esses dias, principalmente o Natal quando estávamos todos. Quem olhasse de fora imaginava uma briga, mas era puro sangue inflamado sem maldade ou agressão.
Hoje em dia fica-se de mal por causa de fanatismo político. Pois é, pra que? O corona não tem olho nem preferência ideológica. Surfa na primeira onda da saliva desprotegida para a outra praia próxima a menos de 1 metro. Somos todos iguais perante o vírus. 
Com certeza meu tio hoje em dia dificilmente pegaria a covid-19 pois já treinava a anos a distância social e a praia dele era sempre fechada. Pouco falava muito se prevenia. Preferia ficar quietinho em sua epidemia de livros, curtindo sua ideologia em cima da prateleira da estante. E ficar de mal desde sempre com o mundo, como fazia, não precisava então discutir.
Os antepassados da família italiana quase todos já se foram, alguns irmãos também. As discussões, hoje em dia, acabam mal. Então vamos enfiar a cara nos livros, nas telas e refletir um pouco na  ideologia que mais deu certo para humanidade iniciada a 2.000 anos atrás, e que funciona em qualquer epidemia a qual foi revisitada pelo “poverello” de Assis no século  XII, deixando-nos um poema perfeito dessa ideologia. Numa de suas estrofes diz a máxima: “Onde houver ódio que eu leve o amor”. Difícil, não é? pensar nisso nesses tempos de gente colérica...

MIGUEL AI/IGELO 

DOIS MINUTOS E QUARENTA SEGUNDO

 DOIS MINUTOS E QUARENTA SEGUNDOS

Dois minutos e quarenta segundos, exatamente isso! O tempo de meu ovo ficar no ponto exato depois que começa a ferver de manhã quando ponho na leiterinha para ferver. Demorei alguns dias pra chegar a esse tempo, depois que me meti a curtir um ovo quente pela manhã. Tentativa e erro. Sincronizando e marcando ate chegar ao ideal. O ideal para meu gosto, mas cada um tem seu gosto, seu tempo, seu tipo... seu porquê.

Parece uma coisa boba começar falar sobre uma coisa tão corriqueira. Mas com essa experiência boba me remeti a tantas situações que vivi automaticamente, que realizei, que aperfeiçoei e não me dava conta que nesses tipos de situações, estão toda essência da evolução, da cultura, da ciência, da filosofia... etc., humana. Ou seja, todo o processo civilizatório. 

Os dois minutos e quarenta segundos que tenho que ficar esperando o ovo cozer no ponto que eu quero, fico com a mente na condição de expectativa, nos últimos vinte segundos olhando o cronometro e ao mesmo tempo absorta durante um pouco além dos 2 minutos. Esse poco tempo absorto a cabeça vai longe. Mas começa no perto, ali mesmo, no ateliê. O que temos para o dia? Muitas vezes uma obra nova ou uma nova obra, uma restauração encrencada na mesa, uma arrumação diferente, etc. Aliás o ateliê é uma fábrica de desafios. 

Quando tem uma obra nova no cavalete venho já de dentro ruminando saídas para continuar de onde parei, mas muitas vezes tudo muda quando confronto depois de muitas horas fora do contato visual do trabalho iniciado. Minha ideia preconcebida do dia anterior de onde parei, muda ao contemplar assim que avisto novamente. Encontro ângulos que não tinha percebido, formas, matizes, histórias, desejos, sonhos esquecidos, etc., que a combinações guardadas pela noite me vislumbram no retorno do dia.

Quando está em plano uma nova obra nos minutos do ovo fico imaginando o que poderia fazer de novo. Já fiz tantas coisas... montar novas composições de figuras de cores? explorar a plasticidade de novas formas atadas a nuances de cores, de sombras, de luz? Ou tentar contar algum sentimento presente, alguma preocupação? ou uma história feliz?

Dois minutos, as vezes e dez segundos, as vezes e trinta segundos e as vezes quando vejo, fiquei tão absorto nas minhas traquinas mentais que o cronometro já passou dos dois minutos e quarenta segundos. Ai corro e desligo rápido, retiro com uma colher o ovo e ponho debaixo da água da torneira para esfriar. Mas dependendo do dia, a mente não esfria do assunto que tratava para o dia no ateliê.

Quando tem uma encomenda com tema escolhido, fico conjugando varias imagens na mente imaginando-as elaboradas na tela. Arquitetando o tema com cores e formas. 

Quando está em pauta uma restauração encrencada... ufa! As vezes tenho que resolver a invenção de uma ferramenta auxiliar ou toda uma engenharia de manejo para solucionar situações delicadas. Aqueles dois minutos e pouco ficam ruminando uma resposta, que ali naquele tempo não vem. Mas quando a pergunta fica bem formulada para o inconsciente na hora que estou de frente com o problema vem o estalo, a eureca. 

Incrível, mas tudo tem a ver com a observação do tempo certo do ovo. 

Em todas as situações a mente criativa ou laborativa tem seu tempo de deixar no ponto o que você pretende, o que você busca. Como também todo o processo de busca de uma solução para cada problema. A depuração até chegar num modo de resolver da melhor maneira. 

A vida é uma construção de experimentos e experiências. As experiências acumuladas te dão competência para solução de novos problemas. Muitas vezes a gente quer que abra a porta, mas não pesquisamos as palavras mágicas. Essa é a razão da mente bárbara querer vencer na força. A inteligência vence qualquer tipo de força bruta. Aliás a história da civilização esta permeada de situações de tentativas e erros, mas sempre tem alguém pra receber um eureca ou uma maçã caindo na cabeça. A própria palavra civilização é auto explicativa disso.  Somos civilizados na medida que criamos os rudimentos de convivência e bem estar comum. E isso foi um longo processo de adaptação ao meio, aliás é um processo sem tempo pra acabar. Quanto mais civilizados mais queremos ser, mesmo que ainda os bárbaros tentem romper com violência esse processo. A civilização sempre vence. 

A obra pronta muitas vezes é linda ou causa estranheza, mas por trás de qualquer sentimento que produza em quem a contemple pronta, existe a laboração interna e externa, de tal maneira que as duas se acertem no tempo do cozimento da obra. E esse tempo é o momento do artista, que não sabe viver sem ter no seu tempo a matéria viva que ao cozinhar em seu âmago, alimente seu viver.

Quem nasceu primeiro? O ovo ou o pintinho? eis a questão. O ser ou o vir a ser? Old questions...

MIGUEL AI/IGELO

O CANIVETE

 O CANIVETE

Sou quase um acumulador compulsivo. A diferença é que, o que guardo no meu ateliê quase sempre dou sentido posteriormente, ou em forma de arte ou algum outro bem para o ateliê, ou ainda uma finalidade sentimental. Não fica nada inútil.
Comecei no período da pandemia me enfiar no ateliê por muitas horas a fio, apesar das reclamações de dentro da casa. Quando ia ver já eram meia noite, 1::00 h... acabou o dia, 14 a 15 horas de atividades em alguns dias. Tem que ir dormir mesmo? Pra quê? Tenho tantas tarefas ainda! Dentre elas além da produção de obras que deve ser regular para poder atender aos pedidos, ainda cuidar de alguns engastalhos como restaurações de obras encomendadas, etc. Uma delas chegou em terrível estado de conservação, num estado repugnante. Com mofo, todo o craquelado escamado, virou pó ao enrolarem para transportar. Dava nojo de pegar na mão. Quando trouxeram disse que ia dar uma avaliada, mas ao ver a situação quis devolver, pois o trabalho era imenso, para mais de oito meses. Enfim não tive como sair pela insistência da pessoa que me procurou e acabei pegando o trabalho. Depois desse acho que posso ressuscitar até obras do Titanic pensei comigo, ficou como um desafio.
Ao mesmo tempo iniciei uma reorganização no monte de quinquilharia que guardo em função do fazer artístico. Sou aficionado em deixar as coisas de maneira muito prática para serem usadas, penso e repenso várias vezes a posição de guardar e a facilidade para pegar quando precisar etc. Quadro de ferramentas, pequenas máquinas de uso em madeira, separação dos pincei, das tintas, as variedades de tintas para várias situações, materiais para limpeza e conservação nos restauros, pedaços de madeiras e MDFs os quais de vez em quando faço meus próprios moveis do ateliê. A lista é grande. Mas sempre tenho que buscar materiais nas prateleiras. E odeio ficar procurando. Procurar desconcentra, faz perder tempo, fico nervoso e bravo ufa... Grande parte dos serviços movimenta muitos materias e ferramentas. E se deixar bagunçar por pressa no que está fazendo, vira um reboliço sem fim.
Um trabalho intenso, criação de novas obras, restauração, organização... 
Num desses momentos de organização encontrei uma caixa com vários retalhos de lâminas de madeiras de várias qualidades, imbuia, cedro, cerejeira, marfim, mogno, etc. que usava quando dava uma oficina de marchetaria em Pradópolis. Ao colocá-la em cima da bancada de ferramentas para dar uma organizada e ver o que deveria jogar fora ou guardar olhei para o lado esquerdo, onde guardo os estiletes e outros instrumentos de corte, então avistei o antigo canivete de meu pai, a espera de “um dia...”. Explico melhor: esse canivete veio pra mim na caixinha de relíquias que meu pai guardava os documentos dele, uma caixinha de lata de bolacha toda decorada dos anos 60. É praxe vir pra mim as sobras documentais das pessoas que se vão na minha família. Tenho muitas cartas de meu pai de minha mãe, dos meus irmãos que já foram, tios, etc. pois mantenho-os conservados e bem cuidados. Sempre gostei disso pois acho que é uma maneira ade cultuar meus antepassados. Deixo-os a disposição de quem quiser ver da família. Sinto a presença deles na minha prole, filhos, netas, pois se não fossem os antepassados não existiria o presente e nem o futuro, por isso é necessário cultuar os que já foram, de certa maneira me sinto amparado fazendo isso. Como se garantisse meu futuro, que seja o genético.
Voltando ao canivete, lá estava ele me olhando, fazendo eu lembrar da minha promessa que “um dia” iria restaurá-lo dando novo cabo, pois não tinha mais a empunhadura, ficando tudo só na estrutura metálica. As lâminas de madeira na minha mão, o canivete... quando ia falar “um dia...” como sempre falei quando olhava pra ele, (e foram vários “um dia...”) nesse momento veio de dentro: O DIA É HOJE! acabou o "um dia"!
Mãos a obra: recortei as lâminas, separei os rebites e a cola para pregar uma sobre a outra. Perdi 2 fechos emendados por estarem secas demais e lâminas muito finas. A noite estava acabando, tomar banho ainda e dormir, mas não desisti. “Você não sai daqui enquanto não acabar” veio uma ordem interna. E assim aconteceu.

Depois envernizado e pronto deixei-o secando e fui terminar meu dia. No dia seguinte busquei-o no ateliê e deixei próximo de mim onde ia. Em cima da bancada, em cima da escrivaninha, do lado do cavalete de pintura... Como se fosse um talismã de energias e vontade de viver. Era um elo vivo com meu antepassado, com a memória de meu pai. Um fetiche de amor a família!
De fato a vida tem alguns momentos caprichosos assim
C’est la pandémie...
Miguel Angelo

sábado, 12 de dezembro de 2020

RESTAURAÇÃO DA OBRA: "TOCANDO A BOIADA" - AUTOR: PAIVA - SEM DATA - CLIENTE: SRA. IEDA

TELA COM VÁRIAS ESCAMAÇÕES, TINTA SOLTANDO EM GRANULOS, RASGOS, ONDULAÇÕES, PARTES IMPORTANTE DESTRUIDAS, SEM NENHUMA FOTO DE REFERÊNCIA ANTERIOR












RESULTADO FINAL






 

Restauração obra: Amazonas - 1938 - assinado J. Lucio - cliente: Sra Ana Luísa -

Rasgos, amassados, muita deterioração da tela, mofo, milhares de escamações






Deformações no tecido


Rasgos

 
Resultado final